segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Do Diagnóstico













Trabalhar em conjunto é uma viagem em conjunto. Comecemos por Macbeth com a sua recomendação de desempenho em tempo, espaço e medida que sintetiza admirávelmente muitas páginas de manuais de planeamento. O plano/promessa forma de ordenar o futuro começa na estação do diagnóstico. O primeiro diagnóstico é exógeno i.e. sustenta a promessa. No nosso caso o diagnóstico usado foi o da rede social. Os diagnósticos deste tipo de territórios têm em comum o jargão sinóptico das chamadas ciências sociais e dão-nos uma visão generalista que alimenta bem a justificação para a intervenção. Pouco a pouco esse diagnóstico foi-se endogeneizando. Digamos que o projecto se apropriou do diagnóstico na justa medida que a comunidade se apropriou do projecto. Dum diagnóstico estático, externo e abstracto passámos progressivamente a um diagnóstico dinâmico, orgânico e centrado no sujeito. Em projecção, arriscamos a dizer, um diagnóstico que tende a confundir-se e a desaparecer na acção da mesma maneira que a água alimenta a terra sedenta. Um diagnóstico que se realiza plenamente quando deixa de existir como categoria independente . Ao mesmo tempo importa voltar à estação de partida, animados pelo sentir actual do projecto e fazer uma análise critica do nosso diagnóstico inicial.


Uma primeira reflexão sugere que os preconceitos embalados no instrumental das ciências sociais não deixam de ser preconceitos e tornam-se mais perigosos devido à sua legitimação ciêntifica. Muitos dos problemas diagnosticados relevam duma visão etnocentrada, culturalmente autista, da realidade do bairro. A ideia de destruturação familiar pressupõe o canône da estrutura familiar “normal”. Na Guiné por exemplo cada individuo tem uma referência à familia, à tabanka e à etnia, não necessáriamente por esta ordem, as crianças brincam ou desempenham tarefas para a comunidade tendo os adultos da tabanca, familiares ou não, a função de ordenar essas actividades. Por outro lado, em muitos casos, um homem tem mais que uma mulher competindo a cada uma das suas mulheres criar os respectivos filhos. Esta lógica, da tabanka, permanece na realidade do bairro, a ela se juntou a necessidade de reagir às próprias condições da diáspora em que Portugal é muitas vezes uma plataforma de imigração na Europa para os homens mas onde as mulheres permanecem como que a ligar o mundo (dos homens) e as suas origens (os que ficaram). Nas situações de crise económica que vivemos muitas vezes os homens procuram trabalho fora de Portugal. Quando os jovens “descarrilam” as mães muitas vezes obrigam-nos a ir para a terra. Desta maneira a familia cruza uma busca de economia e uma procura de raizes num movimento que é muitas vezes dilacerante. Essas familias dispensam o rótulo de destruturadas não porque não o sejam mas porque o adjectivo as estigmatiza e as reduz, resultando no contrário às intenções que animam os diagnósticos.

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